O que significa ser bom? De onde provém o paradigma a nos permitir discerni-lo?
É bom quem agride o semelhante? Rouba o vizinho? Explora seu irmão? Aquele que podendo fazer o bem não o faz? Onde está o código moral a diferenciar o bem do mal?
E o bem, de onde provém?
Isso nos faz recordar a sala de espera do inferno de Dante, habitada pelos indecisos, os quais não fazem o mal nem o bem, os egoístas, a só pensar em si. Seria o caso de perguntar se quem deixa de fazer o bem não estaria fazendo o mal. Neste caso, a sala de espera do inferno metafórico de Dante teria o seu fundamento.
Sabe-se que a obra do poeta fiorentino foi por ele chamada de A Comédia, e, no século XVI, um padre publicou-a com o nome alterado para A Divina Comédia. A mudança parece ter sido feita por quem não entendeu bem a Comédia, e pretendeu insinuar ser Deus um humorista. O padre parece ter subestimado o Criador ao não ter compreendido a grande metáfora do poeta italiano, que não teria concordado com a mudança.
Ao adentrar com Dante e Virgílio na antessala do inferno, tem-se a impressão de já conhecer aquele lugar. É fato já termos ouvido dizer ser o inferno aqui, e o poeta italiano afirmar que aquele fosso enorme, com todas as suas subdivisões, estava sob Jerusalém.
Ao lançar hoje o nosso olhar crítico para a milenar cidade, a metáfora parece ficar mais indecifrável, e a comédia nada de divina.
Deus não pode ser o pai implacável a jogar seus filhos numa guerra fratricida e infindável, e nem propriedade de algum grupo ou associação.
Mas se Deus é o criador de todo o Universo, teria criado também o mal? Ou, metaforicamente dizendo, o inferno?
Afinal, o que é o mal? E o que é o bem?
Deus, além de não ser humorista, não é o professor a nos dar respostas prontas. Uma parte dos mistérios e do objetivo da vida está justamente aí: chegar a responder, por própria conta, certas perguntas complicadas.
Por que vivo? De onde venho? Para onde vou? O que é o bem? O mal? Quem é Deus?
Se não se tem as respostas, faltam conhecimentos. Onde não há conhecimento, reside a ignorância, que parece se confundir com o mal.
Lutar contra ele deveria significar lutar contra a ignorância, começando por eliminá-la em si. O mal provém da mente, pensamentos monstruosos, os quais se foram gestando através dos séculos, e se assenhorearam da vontade e da inteligência enfraquecidas pela ignorância.
Lutar contra o mal deveria significar lutar contra esses pensamentos criminosos, causadores de tanto sofrimento para os seres humanos, começando por extirpar a própria ignorância, que nos faz impacientes, intolerantes, irascíveis e desumanos. Esse seria o início de uma verdadeira cruzada contra o mal.