Uma receita de quibe de bandeja

Uma receita de quibe de bandeja

 

O voo para Brasília sairia às 11 horas.

Na hora agá, avisaram sobre a mudança do portão. Sobe e desce escada, e embarca.

Pedi uma poltrona no corredor, e a do meio para a esposa. Colocaram-me na primeira fila, gogó do piloto, espaço para espichar as pernas. A poltrona da janela ficou vazia. Depois de um montão de gente, a comissária avisou da cadeirante para a da janela.

Dá pra tirar as sacolinhas do chão? Dá sim, como não!

E chegou a anciã toda assistida. Desceu da cadeira, foi pra janela. Deram-me uma sacola, que coloquei no compartimento da fileira ao lado, pois o meu estava lotado.

A senhorinha se acomodou e berrou: E MINHA SACOLA? Coloquei no compartimento, eu disse, e abri a portinha pra mostrar.

Ah! Ainda bem!

Enquanto a velhinha se ajeitava, pela porta entre-aberta da cabine, constatei que o piloto era uma mulher. É a primeira vez que voo com uma mulher comandando. Deus me livre!, berrou a velha, pára o avião que eu quero descer! Tô velha, mas não quero morrer!

Acalmei a anciã dizendo que o copiloto era um senhor grisalho, ela poderia ficar tranqüila.

Eu não sou daqui, moro no Piauí, vou pra Teresina, casamento da sobrinha. O presente está naquela sacola!

Não se preocupe, está tudo bem guardado.

Vim pra cá menina, meu pai me deu pra casar com um sujeito horroroso, eu tinha dezesseis anos. Na lua-de-mel fiquei apavorada com aquele homem peludo na minha frente, e não tirei a roupa de jeito nenhum.

Àquela altura, rompi-me num acesso de riso, que durou mais de hora, e ela não parava de falar.

Coisa mais horrorosa aquele homem pelado. As freiras haviam me ensinado que pegar na mão de homem era pecado, engravidava; beijar então, coisa do diabo! E aquele bicho peludo na minha frente me fez chorar e gritar e chamar a minha irmã por telefone, que era enfermeira, e depois veio e me explicou que casamento era aquilo mesmo, e tinha que deixar aquele bicho horroroso fazer o que quisesse comigo.

Fiquei casada com ele por dois anos e tive dois filhos. Depois separei e vim pra São Paulo e conheci o tcheco, que trabalhava na Volks, ganhava bem, ficou muito rico, viajei pelo mundo, tive mais quatro filhos, mas ele bebia e comia muito, e um dia morreu.

Aí veio a grande surpresa: mais quatro mulheres e seis filhos, pensão pra todo o mundo, perdi tudo. Sobrou uma casinha no Aeroporto.

Meu pai e minha mãe eram libaneses, e tiveram 10 filhas mulheres. Sabe como é, precisavam se livrar das meninas logo, despachar para uns maridos, por que a conta era cara. Por isso ele me entregou para aquele macaco peludo no Rio de Janeiro, eu que nunca tinha visto homem pelado na frente.

Eu tenho 85 e moro sozinha. Ainda dirijo por aí. Os vizinhos dizem que sou maluca. Faço quibe de bandeja, e muito bem.

Pegue a alcatra e moa duas vezes com o trigo, passe manteiga na bandeja e solte uma camada fina por baixo. No meio, carne moída frita com cebola misturada com esnobar. Depois, outra camada de carne moída com trigo por cima, como um sanduiche, e depois pro forno, até ficar tostadinho. O importante é moer logo a carne e por no forno.

Se quiser cru, pode comer, mas tem que ser logo, senão a carne escurece…