Os Amigos e a Longevidade

Os Amigos e a Longevidade

 

Lembra-me Borges, que escrevera gabar-se mais dos livros lidos.

Ler é mais interessante do que escrever. Mas, às vezes, é necessário
fazê-lo, para livrar-se de uma ideia, que não nos deixa em paz, ou
documentar algo vivido neste curto espaço de aventura terrestre.

Este é o meu caso.

É uma ilusão a do tempo passando devagar; num estalar de dedos, os meses
parecem minutos, e os anos, dias.

Os antigos já não são tão distantes, e assim vamo-nos tornando também. E a
literatura se transformando numa recusa por aceitar o rodar dos anos.

A velhice principia quando já não se sabe o que fazer no futuro. Os filhos
criados, dinheiro ganho, certa angústia pelo tempo à frente.

Alguns chamam isto de depressão.

É necessário planejar o futuro, para se ter um passado digno a ser
recordado.

Há pessoas que planejam os anos restantes, imersos em viagens e leitura; mas
isto é pouco, e pode ser enfadonho.

Planejei escrever sobre coisas vividas, nada muito ordenado, um balanço
vivencial, onde pudesse recuperar algumas coisas perdidas na memória.

Fiz anotações soltas no decorrer da vida, e acho que poderão ter alguma
utilidade, pois serei meu primeiro leitor.

Agora mesmo vem à recordação a surpresa que me chegou há anos, numa caixinha
de Sedex, com uma carta do amigo Walter Ono, uma dose do elixir da longa
vida e um exemplar de Fup, o livrinho de Jim Dodge, que iria contar a
história de uma pata diferente.

“Para amigos, não precisa se explicar. Eles entendem. Há vinte anos, venho
desenvolvendo um elixir da longa vida. Dos panteístas, no meio da floresta,
sorvi o amargo sumo da Terra. Dancei premonições de Xamãs, com raios caindo
sobre suas cabeças arrepiadas.

Ouvi polímatas sublimarem sabores do conhecimento destilados em cadinhos de
tantas coisas, com tantos odores, que guardei nas dobras da memória. Longevo
e só, não tem graça. A vida, com os amigos, sim.

Aqui vai uma dose do elixir da longa vida…Fly! Comprovar é muito demorado,
mas posso afirmar que a nossa sobrevida vai até o último sussurro do
derradeiro amigo. Banzai!”