A camiseta preta

A camiseta preta

 

 

 

Em fevereiro de 2017, estava retornando de um passeio de barco mal sucedido pelo rio Itapanhaú e recebi a ligação de meu pai: “Filho, vamos para o Líbano! Será no início de maio!  Vamos com um grupo de brasileiros que participarão da 4 ª Conferência do Potencial da Diáspora Libanesa (LDE). Não precisamos, necessariamente, participar do evento, faremos somente a parte turística”. Fiquei muito feliz e senti que realizaria um sonho!

Foram 12 horas de vôo entre São Paulo e Istambul. Ficamos, aproximadamente, mais 4 horas no aeroporto, aguardando o voo para Beirut. Esta última etapa durou cerca de 2 horas, e, finalmente, madrugada libanesa, chegamos em Beirute.

Cansados e confusos, devido ao fuso horário (6 horas a mais em relação ao horário de Brasilia), fomos para o hotel. Tentamos dormir, cochilamos, e após 3 horas estávamos prontos para o primeiro passeio.

Por ser um evento de grande importância, (LDE) nos foi designado como guia, em caráter de exceção, o professor Roberto Khatlab. Ele é um pesquisador e autor de vários livros sobre história, religião, relação Brasil-Oriente Médio, emigração e imigração libanesas. Reside há mais de 20 anos em Beirute, casado com uma libanesa, e possui filhos. É diretor do Centro de Estudos e Culturas da América Latina na Universidade Saint-Esprit de Kaslik (Cecal-Usek). Estávamos muito bem amparados!

A primeira visita com o grupo de, aproximadamente, 15 brasileiros, foi no museu nacional de Beirute onde tomamos um banho de história, que merece um capítulo à parte. Depois partimos para a Gruta de Jeita, um incrível complexo de cavernas; deu a sensação de estar no livro de Júlio Verne, Viagem ao Centro da Terra.

Por fim, fomos conhecer Harissa, localizada no topo do Monte Líbano, cidade de Jounieh. Harissa é uma grande estátua da Virgem Maria, também conhecida como Nossa Senhora do Líbano. É um lugar de peregrinação, que acolhe, diariamente, peregrinos de todas as religiões. O local é alto, e possui uma vista privilegiada da baia de Jounieh (similar ao Cristo no Rio de Janeiro).

Este era um dia sagrado em Harissa, uma festividade. E aí começaram os alertas de nosso guia- professor: por ser um dia sagrado e de muita peregrinação, nos depararíamos com muitos soldados armados e barreiras. Sim, existia algum risco remoto de atentado terrorista. Apesar disso, nos orientou para ficarmos tranquilos.

 

Observei as pessoas, as cerimonias, as capelas, as canções nos autofalantes, a linda vista, alguns Cedros do Líbano (os primeiros que tive contato) e muitos soldados fortemente armados.

Já estávamos retornando para nosso micro-ônibus, quando um clima de tensão pairou no ar… Logo à minha frente estavam 3 brasileiros de nosso grupo, e um deles com uma camiseta preta foi agressivamente abordado por pessoas dentro de um carro. Entre os berros vindos daquele automóvel, outro homem na calçada segurou abruptamente o braço deste brasileiro e tentou puxa-lo na direção oposta de onde estávamos indo…Rapidamente, nosso guia-professor interveio, desvencilhando nosso compatriota,e nos levando de volta para o micro-ônibus. 

Estávamos todos com uma grande interrogação na cabeça, e nosso guia-professor esclareceu: “O problema era a camiseta preta que tinha o símbolo de um time futebol paulista entre duas espadas e com dizeres em árabe de algo como guerreiros fieis até a morte.” Imediatamente percebi que a camiseta tinha um tom agressivo e subliminarmente me lembrava a bandeira preta do Estado Islâmico (Daesh).

Entendi que devemos sempre estar atentos nos lugares sagrados, e que, às vezes,não são aquele paraíso…