O Super Homem

O Super Homem

 

A prematura morte de Dana Reeve, aos 44 anos, pouco após o desaparecimento de Cristopher Reeve, trouxe-nos algumas reflexões sobre o amor e o sofrimento, causadas por separações irreparáveis, que algumas vezes se mostram como mestras exemplares e insubstituíveis. Como escreveu Platão no Banquete, se, verdadeiramente, os deuses sabem apreciar a força que nasce do amor, mais apreciam e recompensam se é o que ama a se sacrificar pelo amado. E a razão é esta; o que ama é, de certa maneira, mais divino que o objeto amado, pois possui em si a divindade; é possuído por um deus.

Vítima de um câncer fulminante, a esposa do ator, que esteve ao seu lado, e presidiu a Fundação que leva o nome do marido, foi incansável na luta para o desenvolvimento de pesquisas de células-tronco, para ajudar na cura de problemas físicos, hoje insolúveis.

Em uma de suas últimas entrevistas, Christopher Reeve manifestava um entendimento sobre a vida, que o personagem encarnado no cinema, com todos os seus poderes, não poderia manifestar. Seu corpo não representa o que você é. A mente e o espírito transcendem o corpo.

Aquelas palavras nos fizeram recordar Platão na apologia feita em defesa de Sócrates: Por toda a parte eu vou persuadindo a todos, jovens e velhos, a não se preocupar, exclusivamente, e tão ardentemente, com o corpo e as riquezas, como devem preocupar-se com a alma, para que ela seja o melhor possível, e vou dizendo que a virtude não nasce da riqueza, mas da virtude vêm, aos homens, as riquezas e todos os outros bens, tanto públicos como privados.

E também o filósofo alemão Nietzsche, que anunciara o Super-homem no controverso Assim Falou  Zaratustra, e afirmara que o homem é superável.

E mais: Que é o macaco para o homem? Uma zombaria ou uma dolorosa vergonha; o mesmo que deve ser o homem para o Super-homem: uma irrisão ou uma dolorosa vergonha.

Os quase dez anos de imobilidade física fizeram com que o ator, papel central no filme Em Algum Lugar do Passado, compreendesse o que o jovem da ficção romanesca não pode captar: o ser humano não é, apenas, a imagem projetada num espelho, ou a figura que os outros olhos veem.

 “ Quando faço o bem, sinto-me bem. Quando faço o mal, sinto-me mal.

Esta é a minha religião.”

 A bússola moral, emprestada de Abraão Lincoln, direcionou Christopher 

Reeve para outros entendimentos. “Acho que todos nós temos uma voz interior que nos guia; se nos livrarmos de todos os ruídos de nossa vida e escutarmos essa voz, ela vai nos dizer qual é a atitude correta.”

 O Super-homem imaginado por Nietsche, que povoou o imaginário infantil nos gibis e nas telas dos cinemas no século passado, precisou ver-se imobilizado, fisicamente, para descobri-lo, em toda a sua realidade, em sua mente e no espírito, que transcendem o corpo. O ator experimentou, em vida, o paradoxo do personagem, e deixou-nos uma lição e um exemplo, que o filósofo Nietsche jamais cogitaria.

O Super-homem continuará vivendo em nossas esperanças, distante do imaginado personagem do cinema, mas como uma possibilidade de chegarmos a ser o que não somos: pessoas melhores, mais justas, tolerantes, menos cruéis, mais inteligentes, humanas, verdadeiros heróis, que qualquer pessoa poderá encarnar.